A glicerina usada nos vaporizadores

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Glicerina é um componente que está presente em praticamente todos os líquidos para vaporizadores, sendo na maioria dos casos o ingrediente de maior proporção da mistura, normalmente em percentuais de 50% ou mais, chegando até 100% nos produtos chamados de “All VG”, “Max VG” ou 100% VG, destinados aos consumidores alérgicos ao Propilenoglicol, a segunda substância de maior proporção nos produtos, em média correspondendo de 20% a 30% do total.

Principalmente para os consumidores que desejam produzir os líquidos em casa, é imprescindível entender alguns conceitos básicos sobre a Glicerina, pois ela será provavelmente o material que você mais utilizará na fabricação.

O que é a Glicerina?

Quando falamos em “Glicerina” estamos na verdade nos referindo ao componente “Glicerol”, um composto orgânico presente em todos os óleos e gorduras animais ou vegetais. A palavra “Glicerina” define o produto comercial do Glicerol, cuja pureza deve ser de no mínimo 95%. Ele pertence à função álcool e é considerado seguro para consumo humano desde 1959, sendo presente em muitos produtos de diversas áreas como:

Alimentos e bebidas

  • Umectante, solvente, amaciante;
  • Umectante e agente suavizante em doces, bolos e sorvetes, retardando a cristalização do açúcar;
  • Agente umectante nas embalagens de queijos e carnes;
  • Solvente e agregador de consistência em flavorizantes e corantes;
  • Produção de polímeros, como poliglicerol, que são adicionados em margarinas;
  • Meio facilitador da transferência de calor, por estar em contato direto com o alimento, permitindo que algum alimento específico seja rapidamente resfriado para que não perca algumas características desejáveis.

Na área médica/hospitalar/farmacêutica

  • Pomadas;
  • Elixires, xaropes;
  • Anestésicos;
  • Seus derivados são utilizados como tranquilizantes e agentes para controle da pressão, como a nitroglicerina, que é um importante vasodilatador;
  • Em cosméticos ele entra em muitos cremes e loções que mantém a maciez e umidade da pele;
  • Em cremes dentais, é comum ser utilizado para conferir-lhe brilho, suavidade e viscosidade.

Outras aplicações

  • Na produção de tabaco. Quando as folhas são quebradas e empacotadas, o glicerol é pulverizado impedindo que as mesmas se tornem secas e quebradiças, o que poderia ocasionar o esfarelamento;
  • Na indústria têxtil é utilizado para amaciar e flexibilizar as fibras;
  • O glicerol é utilizado também na indústria de papel na fabricação de alguns papéis especiais, que necessitam de alguns agentes plastificantes para conferir-lhes maleabilidade e tenacidade;
  • Pode ser utilizado como lubrificante em máquinas que fabricam produtos alimentícios, que entram em contato direto com o alimento ou, quando existir qualquer tipo de incompatibilidade com os produtos utilizados no processo, tais como em rolamentos expostos a solventes como gasolina ou benzina, que poderiam dissolver o óleo mineral;
  • Utilizado em misturas anticongelantes;
  • Utilizado para preservar bactérias a temperaturas baixas;

A história da Glicerina no vaping

Os cigarros eletrônicos modernos foram patenteados pelo farmacêutico chinês Hon Lik em 2003, que também foi responsável pela criação dos primeiros líquidos para serem consumidos nos produtos. Foram batizados de e-liquids e sua receita praticamente não mudou até hoje. Desde a sua invenção foram utilizados Propilenoglicol (PG) e Glicerina Vegetal (VG) como agentes de transmissão de sabor e nicotina.

Tanto o Propilenoglicol quanto a Glicerina Vegetal possuem características que apresentam vantagens e desvantagens quando isoladas, portanto foi utilizada uma combinação dos dois para usar as melhores características de ambos e obter um melhor resultado.

Inicialmente o Propilenoglicol foi escolhido por não ter sabor nem odor, além de pouca viscosidade, característica que ajudava na absorção do líquido pelo pavio do cigarro eletrônico, na época feito de sílica e não de algodão como atualmente. Porém o componente causa uma potencialização do throat hit, arranhar na garganta causado pela nicotina, e não produz nenhum vapor visível, o que era um problema grave, pois a criação da “fumaça” era um fator determinante para seu produto imitar corretamente os cigarros que ele viria a substituir.

Hon Lik então optou por combinar o uso da Glicerina Vegetal, mais suave no throat hit que o Propilenoglicol, sendo naturalmente doce e que produz um vapor visível, porém muito mais viscosa. A combinação desses dois componentes produziu um composto ideal para seu recém patenteado produto.

Inicialmente os equipamentos não tinham um design apropriado para lidar bem com líquidos muito viscosos, o que forçou os produtos a terem um percentual maior de Propilenoglicol. Com o passar do tempo, o design dos produtos foi melhorado e o mecanismo de pavio passou da sílica para o algodão, mudando todo o sistema e aumentando muito sua capacidade de alimentação de líquido, resultando em uma migração do percentual maior de Propilenoglicol para a Glicerina, invertendo os valores, agora com 70% de Glicerina e 30% de Propilenoglicol, o que se tornou padrão no mercado.

Diferentes padrões de pureza do Glicerol

Como vimos, o nome correto do composto é Glicerol, sendo Glicerina a forma comercial com pelo menos 95% de pureza. Esse é o produto encontrado nas farmácias em frascos indicados para “uso externo” e que não é indicada para fabricação de líquidos para vaporizadores.

Existem no mundo diversas organizações que criam padrões para componentes químicos, sendo uma das mais famosas a USP – United States Pharmacopeia. Fundada em 1820, a organização criou uma farmacopeia (daí seu nome), um compêndio de informações sobre fármacos em geral, definindo pureza, qualidade, dosagem e tantos outros padrões para todo tipo de componente químico utilizado em remédios e outros produtos para saúde.

Quando existe a determinação da sigla USP para algum produto químico, significa que aquele componente possui pelo menos 99,5% de pureza. O restante é todo o tipo de subproduto, desde água até traços de metais, ácidos, graxas, etc. Esse grau de pureza é aceito para todos os tipos de produtos alimentícios. Este é o grau mínimo de pureza utilizado na fabricação de líquidos para vaporizadores em mercados que regularizaram o comércio e possuem regras de manufatura.

Porém, com pureza acima do padrão USP temos o padrão P.A. que significa “pró-analise” ou “para análise”, em inglês utiliza-se o termo “reagent grade” sendo usado como reagente em laboratórios para trabalhos analíticos. É praticamente igual ao A.C.S. e possui 99,98% de pureza. O A.C.S. é o padrão de maior pureza possível no mundo, cuja sigla vem de American Chemical Society (outra organização que criou padrões assim como a USP) e possui em torno de 99,99% de pureza. É o único padrão aceito universalmente e não existe um nível de pureza maior que este.

No Brasil a Glicerina comercializada normalmente utiliza a nomenclatura “bi-destilada”, o que causa certa confusão. Toda Glicerina é bi-destilada em seu processo de fabricação e isso não é exatamente um “grau de pureza”, pois só a palavra “Glicerina” já representa pureza de 95%, de Glicerol, porém o mercado acabou criando a convenção do uso deste termo como sendo garantia de pureza.

Glicerina Vegetal ou Animal?

É preciso lembrar que existem duas origem distintas utilizadas na obtenção do glicerol, sendo uma vinda de óleos vegetais e a outra de gorduras animais.

Teoricamente não importa se a coisa é vegetal, animal, mineral, espacial ou interdimensional, se é 99% pura, ela é aquilo e pronto. Torna-se praticamente irrelevante a origem já que a composição molecular no final é a mesma, obviamente o consumidor vai inalar um produto que é 99% puro certo? Mais ou menos. Existem dois pontos importantes a considerar.

O primeiro é que para um componente químico poder dizer que possui “padrão USP” ele deve ser submetido a testes específicos que buscam por DNA de organismos prejudiciais e contaminantes, além de compostos não desejados como metais pesados, ácidos graxos, entre tantos outros elementos. Isso gera uma potencial brecha quando falamos do Glicerol obtido através do processamento de gorduras de animais, pois a BSE (Bovine Spongiform Encephalopathy) ou TSE (Transmissible Spongiform Encephalopathies), nomes que se referem à “Doença da Vaca Louca”, não é um vírus nem uma bactéria, sendo apenas uma proteína, portanto não existe DNA para ser identificado e consequentemente pode passar pelo “padrão USP”.

Esse foi o único motivo pelo qual foi indicado evitar o uso de Glicerina animal na produção de líquidos para vaporizadores, quando isso passou a ser mais difundido ao redor do mundo.

Obviamente que a chance de um consumidor ser contaminado pela “Doença da Vaca Louca” pelo consumo de Glicerol presente nos líquidos é extremamente baixa, pois consumimos direta ou indiretamente Glicerol de origem animal em vários produtos de nosso dia a dia, mas existe a preocupação quando levamos em conta que o consumo de Glicerol para quem utiliza cigarros eletrônicos é bem mais elevado do que o resto da população. Apesar desta especulação, não há dados científicos acerca do assunto e até hoje nunca houve nenhum caso documentado de contaminação da doença pelo consumo de cigarros eletrônicos.

A segunda questão importante que devemos levar em consideração é a filosofia vegana e a religião Judaica. Apesar de terem motivações relativamente diferentes, é importante para ambas saber que o produto é 100% vegetal. No caso da religião Judaica existe um certificado chamado “Kosher”, que muitas indústrias químicas apresentam junto com o laudo de pureza da Glicerina para garantir que o processo de fabricação seguiu todos os procedimentos adequados.

A Glicerina para diabéticos

Um assunto extremamente importante é o impacto da Glicerina na saúde de pessoas diabéticas, pois o composto possui o poder adoçante equivalente a 60% da sacarose e uma colher de chá representa 27 kcal, praticamente o mesmo que o açúcar, com 4 calorias por grama. Apesar disso, quando consumida, ela não eleva os níveis de açúcar no sangue, assim como não alimenta bactérias que causam a cárie. Só não é utilizado em larga escala como adoçante porque adoça menos, obrigando o uso em maior quantidade, o que elevaria o consumo de calorias já que apesar de ter o mesmo poder calórico, é 40% menos adoçante.

Não há qualquer comprovação científica, estudo ou caso documentado que faça ligação entre o uso de vaporizadores e aumento de níveis de glicose em pessoas com diabetes. Os testemunhos indicam na verdade que não há nenhuma alteração, mesmo com acompanhamento dos níveis de glicose antes e após usar cigarros eletrônicos.

A especialista em diabetes Dra. Sue Marshall (que inclusive é portadora de diabetes tipo 1) autora do livro “Diabetes: The Essencial Guide” (Diabetes: O Guia Essencial em tradução livre) declara que os açúcares presentes nos líquidos consumidos nos cigarros eletrônicos são irrelevantes para alterar o nível de glicose no sangue dos diabéticos e inclusive indica os cigarros eletrônicos para pessoas que tenham a doença de qualquer tipo e não consigam parar de fumar. Confira a entrevista dela ao site “The Blog of E-cigarette Direct”.

Por se tratar de uma doença extremamente personalizada de acordo com a fisiologia da pessoa, o ideal é medir as taxas antes e após vaporar e com isso analisar o comportamento do seu organismo. Acompanhamento médico sempre é o ideal.

Riscos de inalar Glicerina

Sendo um produto presente em grande quantidade nos líquidos para vaporizadores, é essencial sabermos quais são os riscos e potenciais danos que a substância pode causar ao organismo quando inalada. É preciso lembrar que apesar da Glicerina ser usada há muitos anos na indústria e consumida de forma segura das mais diversas formas, isso ocorre através da ingestão ou absorção pela pele, mas não pela inalação.

Muitos estudos já foram conduzidos sobre o tema, mas não há nenhum consenso em relação aos potenciais problemas de saúde que a inalação de Glicerina pode causar. Talvez a falta de um consenso seja resposta suficiente, já que a inexistência de graves alertas ou a própria dificuldade de se encontrar um problema alarmante em relação ao assunto seja o suficiente para concluirmos que se há algum dano envolvido, ele é muito pequeno ou até irrelevante.

Obviamente que a inalação de Glicerina através do uso de cigarros eletrônicos não é um hábito saudável, pois nossos pulmões foram feitos para respirar ar puro. Porém devemos lembrar que milhões de pessoas no mundo deixaram de fumar ao substituir os cigarros comuns pelos cigarros eletrônicos e seus ganhos na saúde são facilmente identificados e documentados. Isso minimamente nos permite ter a confiança de que os danos, se houverem, são muito menores daqueles oferecidos através do tabagismo e que uma migração do consumo de nicotina através da combustão dos cigarros para a vaporização dos cigarros eletrônicos é bem vinda e indicada para as pessoas que não querem ou não conseguem parar de fumar.

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