No debate sobre vaporizadores no Brasil, também conhecidos como cigarros eletrônicos, é constante o uso de argumentos com informações incorretas ou puramente sensacionalistas, feito por organizações de saúde contrárias à liberação do comércio dos produtos no Brasil, que de forma ideológica e desconectada da ciência, promovem uma campanha nacional anti-vaping, servindo somente para assustar o público e afastar a possibilidade de um debate coerente e científico sobre o assunto no Brasil.
Um dos principais argumentos utilizados por essas organizações está em ligar os vaporizadores à indústria tabagista.
Em resumo, a principal ideia defendida é:
Mas isso está completamente errado.
A indústria tabagista não apenas não foi a inventora dos produtos, como sequer detém a maior parte do mercado desses aparelhos, longe disso.
Foi na China que os cigarros eletrônicos foram inventados em 2003 por um engenheiro e farmacêutico Chinês chamado Hon Lik. Sua invenção foi fruto de ver seu pai doente de câncer de pulmão decorrente do tabagismo e por ele mesmo ser um fumante e não conseguir parar de fumar. Criou então um dispositivo que vaporizava um líquido contendo nicotina e o cigarro eletrônico moderno foi desenvolvido. Fundou uma empresa e passou a comercializar o produto.
Com o passar dos anos se espalharam por todo o mundo, chegando na Europa e nos EUA em 2006, enquanto no Brasil os produtos apareceram por volta de 2008. Em 2009 tornaram-se preocupação da ANVISA, que criou a RDC 46, Resolução da Diretoria Colegiada, proibindo o comércio, importação e propaganda dos produtos. Utilizando o chamado “princípio da precaução”, optou pela proibição pois alegou que não haviam estudos concretos na época para garantir a segurança no uso dos cigarros eletrônicos.
De lá pra cá muitos desenvolvimentos tecnológicos foram realizados e os produtos passaram a ser profundamente estudados. Hoje temos uma quarta geração dos dispositivos, com um mercado definido principalmente por centenas de empresas na China. A indústria tabagista só entrou nesse mercado em 2012.
Hoje as tabagistas possuem suas próprias soluções em vaporizadores e também de tabaco aquecido, uma tecnologia diferente, porém que também não possui combustão e portanto significa uma diminuição de danos similar aos vaporizadores, na casa dos 90% menos danos.
Porém mesmo após 10 anos desenvolvendo e lançando produtos, relatórios de 2019 mostram que a fatia mundial na venda de cigarros eletrônicos na mão das indústrias tabagistas é de apenas 17.2%. Mais de 80% desse mercado está na mão das empresas Chinesas que não fazem parte da indústria de cigarros.
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Os produtos usados no Brasil não são da indústria tabagista
Seguindo a narrativa do lobby realizado por essas organizações de saúde, podemos pensar que os produtos consumidos no país são fabricados pelas indústrias tabagistas, mas nem mesmo isso é correto.
No Brasil, a prevalência de uso de vaporizadores é de 7.3% da população acima de 18 anos, de acordo com uma última pesquisa realizada pela Covitel. Isso resulta em mais de 11.2 milhões de adultos consumidores.
Os produtos consumidos por essas pessoas são exclusivamente fabricados por empresas Chinesas, importados da China pelo Paraguay, entrando no Brasil por meio do contrabando na fronteira, alimentando um gigantesco mercado ilegal no país.
Apesar do comércio ser proibido desde 2009 pela ANVISA, o mercado desses produtos só cresce, sendo oferecidos sem qualquer controle ou fiscalização, o que nos leva a concluir que se o país insistir em uma legislação que há mais de 13 anos se mostra ineficaz, o comércio ilegal continuará crescendo em um ambiente de proibição que só favorece o contrabando.
Ligar os cigarros eletrônicos à indústria tabagista é estratégia de lobby
Mesmo sem existir qualquer base lógica ou de realidade, serve ao lobby destas organizações de saúde criar uma suposta ligação entre cigarros eletrônicos consumidos no Brasil e a indústria tabagista, dada a fama que esta possui. É possível conferir essa estratégia em praticamente todos os eventos realizados por essas organizações, em palestras, seminários e eventos de debate, sendo repetido à exaustão.
Isso porque após os anos 50, uma série de ações foram adotadas pela indústria tabagista para minimizar a percepção de risco que o público tinha sobre os cigarros.
Cientistas e pesquisadores foram pagos, médicos foram influenciados e campanhas realizadas para dizer que cigarros não viciavam e não causavam doenças, o que obviamente sabemos hoje ser justamente o contrário. O escândalo foi finalmente exposto e a indústria pagou bilhões, principalmente nos EUA.
O chamado MSA – Master Settlement Agreement, foi um acordo entre a indústria tabagista e o Governo dos EUA realizado em 1998 para pagar um total de 206 bilhões de dólares em 25 anos, com a obrigação de continuar pagando para sempre, à partir de 2018, 9 bilhões de dólares todos os anos, devido aos problemas de saúde causados pelos cigarros.
Atualmente, são empresas que continuam lucrando com um produto que causa doenças graves, sendo a principal causa de morte evitável no mundo, ceifando a vida de 8 milhões de pessoas anualmente.
O menino que gritava “Lobo!”
A história do “Menino que gritava Lobo!” é uma tradicional fábula em que um menino brincava de gritar que um lobo estava chegando para pregar peças nos moradores de uma vila, que vinham correndo ao seu socorro, somente para encontrar o menino rindo e debochando das pessoas. Até que um dia que um lobo realmente apareceu e ninguém acreditou, então ele foi devorado. Um fenômeno similar acontece com a indústria tabagista.
Nos últimos anos o mercado de cigarros vem diminuindo gradativamente. Para se manter no mercado, a indústria tabagista precisou desenvolver novos produtos e foi natural que adotasse os cigarros eletrônicos em seu portfolio, uma vez que já foi comprovado que possuem eficácia na troca dos cigarros convencionais e possuem grande apelo aos fumantes, com o benefício de oferecer muito menos riscos à saúde, com uma diminuição de danos aproximada de 95% a 99%.
Até os mais cínicos entre nós devem pelo menos admitir que, se não fazem porque estão preocupados com seus consumidores, utilizam pelo menos de uma lógica fria e calculista, sendo preferível ter clientes vivos e saudáveis consumindo seus produtos por mais tempo do que perder clientes mais rapidamente por causa de um produto que mata metade dos que usam. De qualquer forma, o resultado obtido é o mesmo, menos danos e menos doenças graves ligadas ao tabagismo, talvez o problema seja apenas a indústria continuar lucrando, mesmo que isso signifique salvar milhões de vidas no processo.
Essa é a mesma ironia da história do “menino que gritava lobo!”, justamente quando a indústria tabagista quer oferecer um produto que significa grande redução de danos e adotar uma estratégia que poderia beneficiar a saúde de milhões de consumidores de cigarros convencionais, aponta-se para o passado e tentam descredibilizar essa ideia.
Isso é visto principalmente quando são desconsiderados dezenas de estudos científicos já realizados pela indústria tabagista, que já investiu milhões em pesquisas com excelente metodologia, apresentando dados concretos e reais, mas que por ter interesses nos resultados, são automaticamente vistos com viés. Apesar disso, como matemática, física e química não são difíceis de se confirmar, muitas revisões por pares independentes já foram realizadas e os dados se sustentam, portanto, como não se pode descartar o conteúdo, é preciso descredibilizar a fonte da informação.
É conveniente para essas organizações de saúde contrárias aos produtos de cigarros eletrônicos, fomentar a percepção de que os cigarros eletrônicos são da indústria tabagista, que sempre terá um objetivo nefasto por detrás de suas ações. Se hoje elas defendem a comercialização de produtos como cigarros eletrônicos, automaticamente isso deve ser ruim.