Os danos causados pelos líquidos falsos para vaporizadores

Publicado:

Tempo de leitura: 8 minutos

Falsificações são comuns em vários tipos de produtos, o que normalmente é sinônimo de preço mais baixo e portanto economia, mas também de menor qualidade e quem sabe prejuízo, afinal de contas o barato pode sair caro. Roupas que desgastam mais rápido, aparelhos eletrônicos que quebram com pouco uso, são alguns dos problemas comuns para quem escolhe adquirir algo que não é original. Mas quando falamos de um produto que será inalado e absorvido pelo organismo, como os líquidos para cigarros eletrônicos, as coisas ficam muito mais sérias e o risco à saúde passa a ser uma grande preocupação.

O mercado 100% ilegal do Brasil

No Brasil o comércio de cigarros eletrônicos e seus acessórios, incluindo líquidos para consumo, é proibido desde 2009 através da RDC 46 da ANVISA, mas a posse e o uso são permitidos. Com essa configuração estranha, a norma permitiu que um grande mercado ilegal fosse criado, sendo possível encontrar produtos em praticamente qualquer cidade brasileira.

Nos últimos anos a ANVISA abriu um processo regulatório para revisar a atual legislação, mas tudo indica que a proibição continuará por tempo indeterminado, insistindo em uma regra que já se mostrou ineficaz, já que esses produtos são vendidos em quase todas as tabacarias, em muitas lojas online e até nos postos de gasolina.

Optando pela proibição, as ações do Governo são somente para tentar impedir a venda e consequentemente o consumo, portanto não há qualquer controle sanitário naquilo que acaba na mão dos consumidores, que já representam milhões de pessoas de acordo com uma última pesquisa realizada pela Covitel.

O contrabando em regiões fronteiriças, principalmente no Paraguai, é muito difícil de combater e milhares de produtos entram no país sem pagar imposto e sem nenhuma fiscalização, sendo o maior volume representado por líquidos para cigarros eletrônicos. Em um cenário como esse, certamente acabarão por adentrar o país produtos de qualidade, fabricados por marcas conceituadas de mercados regulados como os EUA e a Europa, porém, também há a certeza da entrada de líquidos falsos ou de má qualidade, que fatalmente encontrarão seu caminho até os pulmões dos consumidores.

Pela falta de informação que uma legislação exclusivamente proibitiva cria, muitos pessoas sequer sabem a procedência do que estão consumindo e pela ilegalidade do negócio, a maioria dos locais que arriscam não são especializados no tipo de produto que comercializam e tampouco sabem o que estão vendendo.

A ciência já comprovou que cigarros eletrônicos possuem riscos muito menores do que os cigarros convencionais, mas isso apenas em mercados regulamentados, que fiscalizam a produção e a oferta. Em cenários de proibição ou falta de regulamentação, o risco do consumo passa a ser muito maior e impossível de prever.

Trabalhando para enganar o consumidor

Existem dois atores principais que fazem com que o mercado de produtos falsos seja tão grande.

O primeiro é o fabricante, que vive se atualizando para manter seu produto o mais parecido com o original, burlando mecanismos de segurança como selos holográficos, códigos de autenticação, marcas d’água e outros sistemas que tentam facilitar a identificação dos produtos originais. Isso facilita a entrada em mercados regulados ou não, contando com a desatenção ou desconhecimento de quem vende.

O segundo ator é o vendedor, que muitas vezes é oportunista e sabe que está oferecendo produtos falsos, principalmente porque estes possuem margens de lucro muito maiores do que os originais.

No segundo caso, como já dissemos anteriormente, também existem aqueles que agem por ignorância, pois muitos pontos de venda não conhecem o produto que oferecem e vendem produtos falsos por não saber identificá-los, sendo por sua vez enganados pelos distribuidores. Para piorar, até estes últimos também podem não saber o que estão comercializando, tudo graças a total falta de regulamentação, que não cria um mercado controlado.

A diferença entre CLONE e FALSO

Como estamos falando de Brasil, a pirataria é algo muitas vezes aceita e normatizada na sociedade e a prova disso é que temos termos já conhecidos para se referir a produtos falsos como “primeira linha”, “réplica” ou “clone”. Este último foi adotado no comércio de cigarros eletrônicos brasileiro e causa certa confusão entre os consumidores.

O termo “clone” existe no mercado regulamentado dos produtos e significa algo completamente diferente.

É chamado de “clone” um líquido que tenta imitar o sabor de um produto famoso, mas não se passar por ele. Como a receita de um produto original é guardada à sete chaves pelos fabricantes, muitos consumidores tentam copiar o produto fazendo em casa, para baratear custos. Isso é chamado de “clone”, um líquido que busca o mesmo sabor de um produto já existente no, fabricado por uma empresa legalizada em algum país que permite o comércio.

Não é difícil fazer líquidos para cigarros eletrônicos em casa, basta comprar ingredientes facilmente encontrados à venda em lojas especializadas e indústrias químicas, como essências alimentícias, propilenoglicol e glicerina vegetal, usados também em iogurtes, sorvetes, cremes, etc.

Ocorre a falsificação quando se fabrica um líquido com intenção de venda imitando não apenas seu sabor, mas o rótulo com a marca, logotipo e mecanismos de segurança, tentando se passar pelo original, coisa que é crime em em qualquer lugar do mundo, mesmo naqueles em que o comércio de cigarros eletrônicos é permitido.

Sabor agradável, falsa sensação de segurança

Muitos produtos falsos são bastante parecidos com os produtos originais e tem sabor agradável, senão não venderiam e seriam automaticamente excluídos do mercado. Isso só piora a situação, pois este apelo é suficiente para que muitos consumidores decidam pagar mais barato e ter uma experiência similar ao original, achando que se o produto é gostoso, ele deve ser feito de forma parecida, com a mesma qualidade e preocupação com higiene.

Como um produto pode ser muito mais barato que outro, sem comprometer sua qualidade? Não existe mágica, mas temos pessoas que defendem o seu uso, normalmente os mesmos que vendem estes produtos, estranho não?

Em uma rápida pesquisa pelo Google é possível encontrar produtos falsos (oferecidos usando a palavra “replica”) vendidos na China que copiam líquidos de marcas famosas e são oferecidos por somente U$ 2,60 sem exigir uma compra em grande quantidade. O mesmo produto original custa em média U$ 10,00 no atacado ou quase 4x menos.

Qualidade bastante duvidosa

Produtos falsos são muito mais baratos que os originais, isso todo mundo sabe. Mas já parou para pensar o porquê eles são tão mais baratos?

Apesar de um percentual do preço final de um produto ser atrelado ao peso da marca que vende, a “etiqueta” e o “status” agregados ao produto, não há muita margem para magicamente diminuir custos a ponto de oferecer produtos tão mais baratos e ainda ter a mesma qualidade. Produtos falsos são mais baratos porque a qualidade é inferior.

Composição básica de um líquido para vaporizadores

Líquidos para cigarros eletrônicos de qualidade possuem uma receita bastante simples. São compostos normalmente por 70% de Glicerina Vegetal que deve possuir padrão de pureza USP (99% puro), essências de sabor que podem representar entre 10% a 20% do total do líquido e que não devem ser oleosas nem baseadas em álcool, nicotina de qualidade cujo processo de extração deve ser feito seguido rígidas normas de segurança, esta que pode representar entre 0.3% a 6% do total do líquido quando utilizada (há produtos sem nicotina) e restando é composto por Propilenoglicol, um agente condutor de condução de sabor, que também deve ter padrão USP.

Para baratear custos, além de evasão de imposto e oferecer condições inferiores de trabalho a seus funcionários, a maior decisão estratégica está na compra destes insumos. A começar pela pureza dos ingredientes, que podem ser utilizados com suas versões menos puras e consequentemente contaminados com graxas, óleos, metais pesados e outros tipos de substâncias potencialmente danosas.

Mas o maior perigo é representado pela nicotina. Apesar de pouca quantidade relativa no líquido total, ela é de longe o material mais caro e que exige mais cuidado no manuseio, pois é extremamente tóxica. Marcas de qualidade não utilizam nicotina fabricada na China pois o país é famoso por oferecer um produto de péssima qualidade.

Nicotina ruim pode causar graves problemas de saúde. Além disso, pode ser diluída demais e portanto não condizer com a quantidade indicada no produto, desta forma não saciando o ex-fumante e causando recaídas para os cigarros. Há também a possibilidade de ser mais forte que o normal e acabar causando problemas como intoxicação, dores de cabeça, enjoos e tonturas.

Outro fator que ajuda a baratear custos nos produtos falsos é não precisar se preocupar em utilizar um sistema de código de lote nem selo holográfico para garantir originalidade e controle de produção. Se você recebe um produto original de uma grande marca importada e entra em contato com ela, você pode informar o número de lote do seu produto e eles poderão lhe dizer exatamente quando ele foi feito. Muitas oferecem um QRCODE que permite a conferência online da originalidade do produto.

Cigarros eletrônicos não são isentos de riscos, porém são muito menos prejudiciais do que fumar. Se não são totalmente seguros quando usados produtos com a aprovação de órgãos de saúde internacionais, o que podemos esperar de produtos falsos sem qualquer controle?

Ganha o bandido, perde o mocinho

Em resposta ao repórter do NY Times do porquê juices chineses não possuem mercado global, o vice-presidente da Joyetech responde: “Porque são feitos na China”.

A maioria dos líquidos importados são Americanos e Europeus, então onde estão as marcas Chinesas, já que o país domina o mercado de fabricação de aparelhos de vaporização?

O New York times publicou um artigo em 2014 sobre a explosão do mercado de cigarros eletrônicos na China e a falta de segurança para os empregados das indústrias fabricantes desse aparelhos e em entrevista com Jason Yao, vice presidente da Joyetech, uma das maiores empresas do ramo, fizeram esta pergunta e a resposta foi simples: “Porque são feitos da China”.

A China não tem uma boa credibilidade quando se fala em líquidos para cigarros eletrônicos, exatamente porque a esmagadora maioria fabricada por lá são para abastecer o mercado de falsificações. A mão de obra já é uma das mais fartas e baratas do mundo e o acesso à matéria prima é fácil.

Com isso, quem ganha são apenas as empresas piratas, que não pagam imposto (em um país que leva sua cobrança de impostos muito à sério), oferecem condições impróprias de trabalho como falta de segurança e baixos salários e retiram o lucro de quem realmente merece vender o produto, aproveitando o sucesso da marca original, seu investimento em marketing, custos de produção, credibilidade no mercado e toda uma história forjada ao custo de tempo e esforço para então cortar caminho e tirar vantagem de tudo isso. Por si só isso já deveria ser suficiente para boicotar este tipo de produto.

Mas o mais prejudicado acaba sendo o consumidor que está utilizando produtos cuja qualidade é extremamente duvidosa.

Produtos falsos podem até matar

Em 2019 os EUA sofreram um caso gravíssimo de mortes e hospitalizações, que erroneamente foram e ainda são ligadas aos cigarros eletrônicos. Temos um artigo que fala em detalhes sobre a EVALI, nome dado à epidemia. Em resumo, pessoas passaram a ser hospitalizadas e a vir a óbito em consequência de graves problemas pulmonares após o uso de vaporizadores. Depois da confusão inicial, foi identificado que o problema estava em cartuchos de THC falsificados que estavam contaminados com Acetato de Vitamina E, extremamente prejudicial aos pulmões.

Nos EUA muitos Estados permitem o uso da maconha, inclusive na forma recreativa. Por lá existem lojas especializadas que vendem produtos de todos os tipos e um deles é um cartucho de líquido de THC concentrado, consumido em um reservatório específico que também pode ser conectado nos aparelhos de cigarros eletrônicos usados para consumo de líquidos contendo somente nicotina, aqueles comercializados no Brasil, daí a confusão.

Este é um caso muito emblemático do quanto os produtos falsos são perigosos, já que cartuchos de THC são utilizados nos EUA há muitos anos e nunca haviam oferecido problemas graves, até a oferta de produtos falsificados contaminados, que resultou além de mortes e hospitalizações, um verdadeiro pânico mundial e uma falsa percepção dos riscos dos cigarros eletrônicos de nicotina, fazendo muitas pessoas voltarem a fumar com medo dos produtos.

Até hoje nunca houve nenhum caso confirmado de EVALI em pacientes que usaram exclusivamente líquidos com nicotina, mas isso não impede de veículos de mídia propagarem informações falsas à respeito do assunto.

Como identificar um produto falso

Infelizmente às vezes é difícil identificar um líquido falso de um original, já que os falsificadores se esforçam para enganar os consumidores, portanto deixamos aqui algumas dicas para identificar um produto falso:

  • Compare o preço. Quando um produto é muito mais barato e diz ser a mesma coisa, desconfie;
  • Verifique a qualidade da embalagem, os detalhes do rótulo, e use os mecanismos de segurança para conferir a autenticidade do produto como selos holográficos e QRCODEs;
  • Apesar de não ser garantido, há também a analise do sabor e se você conhece o produto original, vai identificar rapidamente quando se trata de uma falsificação, pois a qualidade geral não é a mesma;

Outros artigos

Na última década o vaping salvou 113 mil vidas e economizou quase 1 trilhão de reais na economia e na saúde dos EUA

Relatório traduzido para o Português pela organização científica Direta.org mostra que o vaping tem um grande impacto positivo quando devidamente regulado.

Reino Unido proibirá vapes descartáveis, restringirá sabores e fará mais coisas estúpidas

O governo do Reino Unido decidiu que proibirá os vaporizadores descartáveis ​​e sugere que proibirá os sabores dos vaporizadores. Isto irá desencadear mais tabagismo, mais comércio ilícito e mais soluções alternativas.

9 fatos e mitos sobre o vaping de acordo com o Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido

Menos prejudiciais do que fumar, ajudam contra o tabagismo, menos nicotina que os cigarros e outros fatos que o Brasil ignora sobre o vaping.

Mais um grande estudo confirma os benefícios dos cigarros eletrônicos

Um conjunto crescente de evidências mostra que os cigarros eletrônicos são muito mais seguros do que fumar e a ferramenta de cessação mais eficaz disponível.

FDA divulga dados de 2023 dos EUA com queda no tabagismo e no uso de vape adolescente após regulamentação

Tabagismo adolescente é o menor de todos os tempos e o consumo de cigarros eletrônicos continua caindo.

Colégio Real de Psiquiatras da Austrália e Nova Zelândia declara que vapes são alternativa mais segura do que o consumo de tabaco

Instituição declara que o vaping pode ser prescrito para pessoas adultas que fumam como forma de tratamento contra o tabagismo.

Newsletter

- Receba notícias em seu email

- Não compartilhamos emails com terceiros

- Cancele quando quiser

Últimas notícias

4 milhões de brasileiros já usaram cigarro eletrônico no Brasil e a maioria vê propaganda na TV

O relatório Covitel 2023 coletou informações de 9 mil pessoas, com 18 anos ou mais, entre janeiro e abril...

Manifestação a favor da regulamentação dos cigarros eletrônicos ocorre nesta sexta-feira em Brasília

Consumidores foram convocados a se concentrarem na frente do prédio da ANVISA a partir das 9h de sexta-feira (1º)

A desinformação sobre os cigarros eletrônicos faz vítimas reais

O estigma contra os produtos e consumidores vem causando danos graves na vida das pessoas.

Globo compartilha informações falsas em editorial que faz campanha contra cigarros eletrônicos

Contra seu próprio princípio editorial de isenção, Globo toma partido contra a regulamentação do vape no Brasil, usando informações falsas para causar pânico moral.

Apoiar a proibição dos cigarros eletrônicos no Brasil é apoiar o terrorismo

Cidadão Sírio que morou em Belo Horizonte financiou ações terroristas graças ao contrabando de cigarros eletrônicos no Brasil.